segunda-feira, junho 25, 2007

Fora da poesia não há salvação

Foi inaugurada sem dúvida uma nova era. Seu surgimento foi assegurado pela multiplicidade. Estamos inseguros, apoiamos no vácuo e por isso, distantes de nós mesmos e do outro. Vivemos então, o tempo da indiferença.
O fato é que estamos atônitos, violentados pela “elegância” das palavras dos mestres condutores que criam suas divinas leis, seus manuais de conduta para disfarçar seus interesses individuais.
Somos hipnotizados nas praças, nos templos, no trabalho, nas escolas, na virtualidade das nossas relações. Nossas consciências perderam-se nas esquinas.
O tempo da multiplicidade é definido pelo meu sem tempo. Tempo que hoje me traiu. Memória que traiu o tempo. Tempo de correr do tempo. Tempinho de nada. Tempo de celebrar os paranóicos. Bem dizia Fernando Pessoa: “Queriam-me casado, útil, cotidiano e tributável”.
Mediante este arsenal de mecanização do ser humano, resolvi não mais enxugar as lágrimas e a tentar evitar as tristezas dos tristes. Mas, parabenizá-los, pois, em cada lágrima derramada, há uma sinalização de que o homem ainda é humano.
A sociedade atual busca subterfúgios para negar a realidade profunda da existência humana, a dor. Estamos numa competição frenética com a máquina, não só no campo produtivo capitalista, mas, sobretudo, numa busca ilusória da ausência do sofrimento. Centrar-se nesta busca é fragilizar-se frente à vida. Por isso, dizia Shopenhauer: “o homem é um pêndulo que oscila entre a dor e o tédio”. Se “o poeta só é grande se for triste”, temos na poesia a sutil saída para a humanidade. Uma vez que esta desvela, expressa a intimidade e a essência do existir. Sem querer prescindir da grandeza destes homens... Hoje, pouco necessitamos dos grandes mártires, dos ditos paradigmas novenais. Temos urgência de sentidores, de poetas. Pois, a poesia deshierarquiza a relação com Deus, nivelanos com o transcedente. Sendo o código que decifra a alma e a própria alma decifrada para que se torne um novo e atraente segredo.
Então, poeta é esta via uterina que chora extática a penetração poética. No poeta há sempre uma prontidão a um simples estímulo. Uma sensibilidade que atrai e mu(o)difica, pondo beleza nos atos. Ser poeta é ser penetra; inserir-se nas intimidades das coisas e transpassar pelas mínimas aberturas. É espermatizar a pedra, o riacho, a árvore. É fazer do átomo um ponto orgásmico e engravidar os olhos de sucessivas gravidezes. Ser poeta é sofrer a aprendizagem de não ser real, de não ideal e não existir. É ser o hífen que liga o nada ao nada, encontrando na inutilidade seu bem querer. É ter de suportar no silêncio o barulho das palavras, das frases, dos gemidos e confundir-se por só haver silêncio. É cometer o crime de não amar a vida e ser redimido por poetizar a morte. É distorcer a perfeição do amor, voltar a ser criança e reinventar o ser adulto. É perder por momentos eternos a dimensão da explicação, sobrar nos lábios um nada, quando há muito no dizer. É ser coagido de lado a outro e a derramar pelos poros liberdade. Gritar em cada gesto uma gestação. Trilhar um caminho sem rumo, sem pernas, sem corpo, sem estrada... É não ser visto.
Termino parafraseando Rubem Alves: Fora da poesia não há salvação.

Gentilmente encaminhado para este blog pelo amigo Flávio Lima( Fi de Flávio).

Messias Nunes

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